(Elegia a paternidade)
Todo mundo deveria ser pai
E na primavera acompanhar os primeiros “desajeitos”
De quem apenas tenta ser – e isto é glorioso
Porque ser pai não se assemelha à maternidade
(de nenhum modo!)
Que desde o não-ser enovela enredos com o vir-a-ser, indeléveis.
O ser pai se inicia na educação informal:
Sem cartilha, sem quadro negro, sem dever de casa...
E é na primavera com os odores dos lírios
Que os noviços se atropelam
Buscando desvencilhar o seu cheiro
(Mas o olfato não é tão bom assim!)
Ainda nos corredores olha aquele, repara naquela, mira aqueloutro
E o coração salta como grilos em noite de núpcias.
É festa:
A lua se converte em musa,
As estrelas iluminam estrofes
E cada verso contém um onirismo inalcançável pelo próprio Ícaro.
São tantas os tropeços para ser pai:
- Meu filho deve alcançar o infinito!
- Precisa destacar-se nisso, espelhar-se naquilo!
- Tocar cítara numa orquestra angelical!
- Deve ser exemplar!
- Tem que conquistar as terras pelas quais nunca naveguei!
No verão
São tantas as luzes – e estradas a serem vencidas.
- Há tanto o que fazer!
Tantos caminhos prescritos e descritos para ela,
Que ainda nem mesmo aprendeu a andar,
Ora, deverão ser poetas e superar o espírito de Homero;
Ora, seguir os passos do pai: “mas precisa fazer melhor”:
Ser o que não fui, andar por onde não conheço,
Colher a primeira nuvem do céu...
E nós, os pais, ainda em tropeços,
Sobejamos a felicidade que nutre nossos filhos.
Mas a vida não é linear
E ainda não descobrimos
Por quem os sinos dobram.
No outono
As folhas caem,
As flores já não estão lá, tampouco seu perfume,
Os dias, não sei por que, se acinzentam
E já não nos enxergamos mais como antes
Em terreiro de amantes.
A opacidade do dia desvencilha a alegria
E a crueza da vida
Enrijece o pai na pupila do filho
E por minutos intermináveis já não sentimos nosso reflexo
Na íris dela –
E para isto não nos preparamos!
Aprendemos a ser pai na educação informal:
Sem aula da saudade,
Sem cultos religiosos,
Sem colação de grau,
Sem estágio supervisionado.
... E a vida continua...
E pássaros migram por entre as estações.
No inverno
Ser pai já não é sê-lo
Ou se ainda o for
A satisfação habita na conversão em guarda-chuva em noites de
tempestade –
Sem esperar pelo dankie
Por que ele não virá – você não terá direito.
A chuva torrencial lá fora
É originária de ti
E ensopa a tua alma implacavelmente
Porque foste tu – assim se define –
Que semeou vento.
E é exatamente no útero funéreo desta estação
Que deves aguardar pelas catarses:
As flores não colhidas na primavera,
O calor causticante do verão,
As folhas que desanimaram,
As sementes que não brotaram,
A nota semitonada da cítara –
Tudo o mais se dissipa
Como a fumaça daquele cigarro que nunca fumaste,
Mas deverias.
Autor:
Professor Evanilson Tavares de França
Escola Estadual John Kennedy.
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